TRÊS
POEMAS DE YEATS
SEM
SEGUNDA TROIA
Por que inculpá-la dos inúmeros tormentos
com que me carregou, ou por ter ensinado
aos ignorantes meios rudes e violentos,
ou por ter contra o grande o pequeno incitado,
houvesse neste audácia igual ao seu desejo?
O que a colocaria em paz, com uma mente
que a nobreza tornou simples como um lampejo,
bela como a tensão de um arco – o que atualmente
não
é tão natural, nem fácil de encontrar,
sendo alta, e solitária, e muito altiva enfim?
Que mais teria ela empreendido, sendo assim?
Mais uma Troia, então, para ela incendiar?
A
SEGUNDA VINDA
A
girar e a girar, num amplo círculo,
O
falcão já não ouve o falcoeiro:
As
coisas desmoronam, sem um centro;
Mera
anarquia alastra-se no mundo;
Cresce
uma onda de sangue, e em toda parte
Se
afoga a cerimônia da inocência;
Hesitam
os melhores, e os piores
Estão
cheios de acesa intensidade.
Por
certo é próximo um desvelamento;
Por
certo é próxima a Segunda Vinda.
Segunda
Vinda! Ah, mal o pronuncio,
E
vasta imagem do Spiritus Mundi
Turva
meu olho: algures, no deserto,
Uma
forma de leão com rosto de homem –
Olhar
vazio e duro como o sol –
As
lentas coxas move, enquanto em volta
Pairam
sombras de pássaros irados.
Desce
a treva outra vez; mas sei agora
Que
vinte séculos de um sono pétreo
Levou
ao pesadelo um simples berço;
E,
chegada a ocasião, que rude fera
Se
arrasta até Belém para nascer?
A
DESERÇÃO DOS ANIMAIS DO CIRCO
1
Busquei
um novo tema inutilmente,
Por
mais de seis semanas o busquei.
Talvez
hoje, alquebrado, me contente
Meu
velho coração; mas também sei
Que
os bichos de meu circo, até o presente,
Verão
e inverno, tudo já mostrei:
Garbosos
jovens, cintilante biga,
Mulher
e leão, e o mais – que Deus o diga.
2
Posso
senão velhos temas lembrar?
Primeiro
Oisin, levado pela mão
Por
ilhas de alegórico sonhar,
Vã
batalha e prazer, repouso vão –
Temas
do amargo peito, a se julgar,
Próprios
para cortês, senil canção;
Mas
que importou a mim, que o convoquei
E
só por sua noiva suspirei?
Como
contraverdade, eis que aparece
A Condessa Cathleen,
como a chamava;
Louca
de dó, por paga a alma oferece,
Mas
o imperioso Céu logo a salvava.
Julguei
que o fanatismo e o ódio vencesse
A
alma de meu bem, tornando-a escrava,
E
isso um sonho gerou, que num momento
Foi
todo o meu amor e pensamento.
E
enquanto o pão roubavam Cego e Tolo,
Cuchulain
o atro oceano combateu;
Mistérios
da alma ali; mas por meu dolo,
Após
tudo, só o sonho me acendeu.
O
caráter, que um feito seu isola,
Alça
o presente e da memória é rei:
Palcos
e atores me ocuparam mais
Que
as próprias coisas de que eram sinais.
3
Esta
imagem possante, de completa,
Cresce
na mente, mas onde é gerada?
Ruas
sujas, ou lixo de sarjeta,
Velha
chaleira, ou garrafa quebrada,
Ferro,
osso, trapo, essa velhinha abjeta
Que
guarda o caixa... Agora, sem escada,
Fico
onde a escada sempre começou,
Na
loja de osso e trapo do que sou.
(Traduções de Renato Suttana)
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