"ENGANO E VAIDADE" E
OUTROS SONETOS
(Maria Eleonora Cajahyba)
ENGANO E VAIDADE
A Treu
Ambos erramos. Eu, quando o deixei,
Mas sentindo a constância da saudade.
Tu, quando fiquei só e, por vaidade,
Não me perdoaste, e, livre, retomei.
Tentei debalde; nunca mais amei...
Tomei-me pária, errante, na orfandade,
Buscando uma suposta afinidade.
Ó leda fantasia que sonhei!...
Vivendo assim, cansados de sofrer:
Distantes – penso em ti e tu, em mim.
Como é triste o refúgio sem nos ver...
Este é o látego amargo de perder
O verdadeiro amor, esse festim
De dois, unidos para florescer.
O GEMIDO DO VENTO
Por que, ó vento, tu gemes, soluçando
Um canto agonizante e a melodia
Que embala os numes na noite tão fria,
E beijas os coqueiros, sussurrando?
É madrugada. E voltas, sibilando
Este sinistro grito que partia
Para o mar, e a onda indômita cuspia
Densas espumas alvas, prateando...
Pára. O meu leito espera-me e me aquece.
O sono ameno apaga tudo e esquece
Todas vicissitudes do amargor.
E surge a nova aurora do amanhã,
Trazendo a folha nova bem louçã.
É o despertar da vida sem a dor...
TUDO E NADA
Já cantei Tudo o que senti e vislumbrei:
Mulher, homem, céu, terra, fogo e o
vasto mar;
E os sentimentos – dor, saudade do luar,
O amor, a nostalgia e o mundo que
sonhei.
A esperança, a bondade e as rosas que
plantei
No meu jardim querido, onde fico a
cismar...
Penso que esqueço e sei que estou a
recordar...
E o pensamento vai e volta, se o
busquei.
A vida é o sonho do nosso bem ou do mal;
Essa felicidade eterna é uma ilusão
Que acalenta o inocente em pleno
vendaval.
Maior dádiva é amar a vida doce e sã.
O Tudo e o Nada em nossa mente estão!
O Hoje é o Ontem, lembrado e o Porvir do
amanhã.
A CASA DA COLINA
Reflete o Rio Preto a casa da colina,
Branquinha com varanda em redor e o
jardim
Com rosa perfumada e orquídeas e jasmim,
Lembrando a minha infância airosa de
menina.
A baixo, corre a negra água, tal
serpentina,
Fecundando o sopé do morro até o fim...
Do alto, avista-se o céu, alua e tudo
assim;
E à tarde o adeus do sol à estrela
vespertina.
Do meu jardim de inverno, olho sempre a
paisagem
Que me fez recordar os meus amados Pais
Que a contemplavam como a esplêndida
miragem.
Eles partiram... Mas ela nada mudou...
Ronda-a freqüente o triste eco dos
nossos ais:
Esta saudade eterna – e o vento não
levou...
A MATURIDADE
É a fase da razão e do senso maduro.
Planeja-se o amanhã e o bem que delibera
Com tal filosofia... eis o fIm da
quimera,
E da esperança que só vislumbra o
futuro.
O sentido se aguça e o passo é mais
seguro;
Surge o equilíbrio e a paz suave que
acelera
Esta maturidade amena que se espera...
Sobrevém à paixão, frio amor de Epicuro.
Mas a Mulher aos trinta, esplende a
formosura
E a madureza bela, elegante e outonal,
Exibindo ainda a flor da graça e da
candura.
Hosana à plenitude hígida e exuberante,
Que se mantém alegre, ardente e jovial!
É a dádiva divina -o prêmio triunfante.
AMOR
O amor é uma espécie de amizade
superlativa, e isto só se pode sentir em relação a uma única pessoa.
(Aristóteles)
Nasce ao primeiro olhar sem pressentir;
Dorme sem perceber no pensamento;
É uma doce euforia e atroz tormento;
É o Céu e o Inferno juntos a iludir.
É raro o Amor, capaz de perseguir
Até o fIm da jornada, este acalento
De dois, que esquecem grande sofrimento,
Rindo e chorando, e a lágrima a cair...
Ó servil e Senhor de todo o Mundo!
Prende e solta os famintos corações,
Brinca com o sentimento, o mais
profundo.
Um dia as preces vão ao Redentor
Da vida, ouvindo a súplica e orações:
– Não matarás a quem te matará de dor!
(In Clamor do Mundo, Salvador –
2006)
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