COISAS,
COISAS E LABIRINTOS...
(Nicolau
Saião)
l.
Coisas, coisas e labirintos, pedras
entre
pedras
– que o sol aqui se põe muito mais tarde
A
sonolência da erva
Fórmulas mortas
que
a memória nos dá. Tudo o que de longe pela noite
se
vê Animais
parados como desejos Como
desconhecidas
raízes Figuras
que de repente
erguemos
por dentro (a casa nova e sem ninguém, a
oliveira
cortada, a mágoa de saber que flores e frutos
são
já de uma outra vida, pois que os meses
inconclusos
se afastam). Bosques
que num repente
devagar
se consomem Destroços na lembrança
nos
olhos ou nas chagas
Diferentes
coisas sobre os
espaços da manhã.
2.
Vestígios de as águas Troncos
mortos sílica
nas
páginas impressas. O
rosto um rosto
que
se sabe perdido As
leis do mundo
serenamente
postas na paisagem. O negrume da noite
e
um quadrado de açúcar no interior do tempo
Na
chávena de chá
oferecida
bebida no sopé
da montanha.
À
nossa frente, a casa
e
uma figueira morta. Olhos semicerrados
pela
ardência do ar – um corpo que submete
passos
paragens sedes.
Que em tudo se define
nossa
pura vontade
Não de
apenas
zonas rochedos
ou areias As
aves
que
nunca iremos ver.
3.
Por uma palavra se
começa,
por uma lembrança se inicia
a
trajectória o poema
a travessia
o primeiro
rumo
vicinal: a voz de um Senhor
Alarcón,
vereador da Cultura – segundo o disse,
parente
do
Pedro António. Conversa de três bicos, conversa
de
quem não tem do deserto senão mapa de poiso
eventual
de cabras se as
houvesse. Não poder
informar não
alcançar,
não ver
silhueta
de acanto ou pintarroxo, não poder ter
nem
papéis nem folhas de oliveira
na cabeça
como
o chapéu
do conto
dos
montes escalavrados Não
ter viagem bendita para dar
a
visitantes além do seu pequeno
rosto
de um vaqueiro de
pechisbeque. Assim
foi
meu encontro primeiro com essas rochas de
ao longe
ao
perto ao raiar dos
caminhos : o Alarcón
sem
telefone para as dunas primitivas
para os
movimentos
da alma: a secura o
calor que em estradas
de
outra Europa pensei, vi e
multipliquei
para
meses distantes num depois
no caminho digamos entre
Assumar
e Arronches, no pino
desse Verão
recordado:
o combóio para Sul que os dias grandes nos davam
–
seu verdadeiro coração dos espartais, do braço que embala (cinge)
– e era
um
olhar nostálgico bem junto de Piedras Negras, a redondez
acústica
o diagrama público lembrado
a força
de
um deltóide sustentando a mochila
ou então
a
rotação da luz
a aridez sonora
da
singeleza.
(in
“Cantos do deserto”)
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