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POEMA DE SETEMBRO
(Nicolau
Saião)
Sugeriram-me um poema sobre Setembro. Comecei
de imediato a pensar: tirar um Setembro das recordações? Criar
um Setembro que jamais existiu? E criar como? Só como entidade
fortuita, como vivência crepuscular? Num princípio de manhã?
Setembro como lugar e hora, como estância perdida? Porque
Setembro é algo de impalpável, estranhamente inexistente, um risco
numa
parede entre duas portas cerradas. Ou então
algo tão intenso e cheio de presença como uma sombra enorme
num pátio abandonado. Setembro como memória perene? Setembro como
fuga
como chegada à palavra e ao horizonte das formas?
Eis a voz. Eis o nome. Eis o lugar que se escolheu. Um vestígio
de matéria absurdamente concreta. Porque os demais momentos
são agora um ruído junto das casas que se habitaram
com todo o seu encanto e desencanto primordiais. Com a semelhança
de olhares e de ausências.
E assim Setembro me poisou num ombro
como réstea de sol num dia inteiramente comum. Setembro
que é dito, que é escrito, que é rememorado
Setembro que se olha e nos define como seres ao anoitecer
ante este muro sobre o qual já se vêem os astros habituais
e que são tão nossos como o grito súbito de uma ave indistinta.
Setembro que não sei dizer
Setembro que nos foge quando o tentamos olhar
Setembro que lembro e que conheço como uma cor amada
mês que morre e revive em mim como um soluço um beijo um aceno
de mão sulcada por muitas linhas e pensamentos.
(Do
livro em preparação Escrita e o seu contrário)
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