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Holney Mendes, Jardim de infância (detalhe)

 

GRANITO

 

(Nicolau Saião)

 

Um poeta pode durar sei lá 80 anos

Há mesmo alguns que duram noventa anos

Por seu turno uma mesa de madeira   dessas vulgares

dessas com um tampo de tábua que as boas donas de casa procuram

sem sucesso que fiquem menos rugosas

- e de repente um rasgão de luz o perpassar duma lâmpada

um traço de vela que alguém acendeu no escuro

devolve-lhe o seu perímetro real de pinho decepado

de pobre utensílio ou de superfície usual -

Mas dizíamos nós  aí vinte trinta anos

aí uns setenta se for bela usança de uma casa afastada?

 

Olhei e vi: um muro nem mesmo bem cuidado de

granito

(palavra que contém não apenas o simulacro exterior

de matérias geradas pelo interior da terra

mas também o que se sente ou se adivinha ou que

se desejaria fazer frutificar: e é a mancha

de qualquer líquido por exemplo    a água

mas nunca azeite ou vinho  ou até mesmo mercúrio

o sólido cruzando o seu contrário

enigma)

apenas pedras sobre pedras naquele campo a anoitecer.

 

E um arrepio correu-me dos dedos aos olhos.

E nada mais perguntei a mim mesmo.

E nada mais desde esse momento quis saber.

Disse para mim: granito.

Disse para mim: é então este o granito.

E olhei de novo em volta como se de repente

 

uma emoção anónima terrível singular me tivesse alcançado.

 

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