[NÃO SE TECE A VIDA] E
"O DESDITADO"
(Maria da Conceição Paranhos)
[NÃO SE TECE A VIDA]
Não se tece a vida
em teares mecânicos.
Nada inda foi dito.
Expatriado, choras
teu perdido anelo
de estar frente aos altares
de onde recende a luz
do alto, te transporta.
Quando levitas, ousas
sorrir e assim prossegues
— cintilas nesta noite
de sombra cerrada.
O divino transporta
teu viver encantado.
O DESDITADO
Je
suis le Ténebreux, — le Veuf, — l`Inconsolée,
Le Prince
d`Aquitaine à la Tour abolie :
Ma seule Étoile est
morte — et mon luth constellée
Porte le Soleil noir de la Melancholie.
(El Desdichado.
Gérard de Nerval, 1875)
A vida pulsa em cada
tom, e ouço,
palpitando-te o
peito a dor e o luto
no alaúde lilás. Soa
o clarim.
Enquanto o verso,
livre, te seqüestra,
viúvo obscuro tanges
tua corda,
na casa deste verso,
e a perícia é louca.
Arrastas berro
bárbaro na boca,
se és poeta de todos
que não falam.
Mas és o desditado,
és o bastardo,
cavaleiro do tempo
em espaço parco,
meio à voracidade da
poesia
—
que não te deixa, a
ti, o deserdado,
mesmo se os
vendavais te varram a vida,
e o grito da tua
chaga purgue e lave
a tua voz extrema de
cantor,
se lá chegares! É
que jamais chegas,
jogo de júbilo face
ao tormento.
Então teu corpo
desce a rampa estreita.
|