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PARA O BEM DAS CONVERSAS LITERÁRIAS
(Marcelo
Bueno de Paula)
Todo
leitor que se preze alguma vez já mentiu ter lido aquela famosa
obra cuja leitura seu interlocutor, outro leitor que se preza,
considerou obrigatória a todo leitor que se preze. Nessas circunstâncias,
seria inconcebível a um leitor que se preze que ele revelasse nunca
ter lido tal obra, mesmo desconfiando de que o seu interlocutor,
leitor que se preza, também não a leu.
Mallarmé,
no primeiro verso de seu poema Brise
marine (Brisa marinha), diz: “La chair est triste, hélas!
et j'ai lu tous les livres.” (A carne é triste, ai!, e eu li
todos os livros.) Nenhum leitor que se preze, inclusive eu e você,
leitores que nos prezamos, deveria abdicar da virtude de glosar, em
proporções infinitamente mais modestas, o final desse verso do
poeta francês. Isso, claro, para o bem das conversas literárias.
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