Home Poesia Prosa Traduções Colaborações Arquivo Contatos

Bem-vindo à             homepage de Renato Suttana.

Pablo Picasso

 

ÚLTIMA LIÇÃO DO ANO, À MODA DE UM DEVER DE CLASSE... (Fragmentos)

 

(Mauro Mendes)

 

Leitura de mim para mim do que eu não disse, mas percebo. Porque eu não me engano, me vejo, me olho de soslaio, sou da minha própria laia. Não quero voar. Rastejo meu alto horizonte indefinido. Verde bruma se perdendo no desequilíbrio das coisas que não ficam. Passo. Passa lento o meu descompasso, a minha bebice, a minha mesmice. Se palavras pudessem florescer, eu não escreveria. Deixaria que morressem à míngua de sereno e orvalho. Não as colocaria diante dos teus olhos muito claros, que não querem ver. Como os meus, que, aliás, vêem tudo. E também posso chorar. E ver e chorar. Eu sei, não me diga! Não me diga nada e, pra mim, já chega! Quero voar! No fim do ano, me safo, me safro, me inspiro, sou a minha própria safra! Produto de um arco de 365 graus. Girando, arcaico, saindo pela tangente. Repetido. Concentrado na minha viração. Mas, amanhã, é um novo ano. O mesmo ano novo... No fim do ano, tenho que escrever alguma coisa, o que vier à cabeça, como nos velhos tempos... Sacudo meu pó, minha poeira de estrelas, minha poesia atrasada de espaço-versos... Viajei de meteoro, não sei se cheguei em hora de desaponto ou desatempo. É que eu sou mesmo assim tão sem poesia, como a poesia dos teus olhos vistos sem mais... No espaço sem fim, hadeus!? O espaço de mim sou eu, restos de mim com um pouco de teu. E aí, Baby, o teu espaço se alarga múltiplo em tardes alvacentas de delírio unânime. É quando. Não seja quanto a dimensão. Não seja caso, descaso, disquanto, choro caído, não seja em vão! A poesia do teu espaço mesmo no chão. Por quê te queixas de não saber nada? Eu sei tudo de que, um dia, preciso ficar sabendo... Sou mais as tuas madeixas, as gueixas... Rimos a noite toda desta rima rasteira, sem eira nem beira! Eu tenho restos de sol, a noite tem planos. Eu, réstias. Na campina ensolarada e verdejante, flores, floridas lantejoulas. Alamedas ledas de borboletas a medo. O campo é demais agora de falar. Vejo mesmo por alto, não fora a intenção de ir por lá, qualquer noite de vaga-lumes. Todo dia quer a noite pra se distrair e tem noite todo dia. Que maravilha! Ando de pernas-de-pau madrugadas intercaladas. O vento faz um estardalhaço! Logo o vento, este palhaço! O vento não tem segredos. O vento ventríloquo sopra em toda parte. O vento amalucado mete por baixo da porta a poeira de ontem, o jornal de amanhã, o pão da tarde... Já cuidei da manchete de ontem, desta notícia que não se ajusta... Lembranças de polvos misturados com mar... E não sei mais escrever um poema com jeito de te agradar. O mar, há muito, já estava, quando lá chegamos e, de algum modo, estamos atrasados... O tempo desfutura... Só nos resta sentar na areia, e a areia da praia é areia mesmo e nós somos nós mesmos e o mar... Navios apontam do outro lado da linha. O marinheiro Popeye me espinafra! O sol derrete todos os sorvetes e não nos resta senão.... Nossas pegadas permanecem um mistério para os caramujos, que continuam furando buracos na areia... Deus te salve, brioso barco, das águas da ressaca, do plenilúnio, dos vasos de guerra, conchas marinhas, caramujos furando buracos na areia, por onde a vida, se mar, se enche, por onde a vida, se mar, se isca, por onde a vida se pesca... Deus te salve!

 

 

Retorna ao topo

Outros escritos de Mauro Mendes