NOITES
DO CASTELO
[Sobre
Visita do Fantasma na Noite] (*)
(Mauro
Mendes)
A
Renato Suttana
“Oh!
Meu Deus! Eu poderia ficar confinado numa casca de noz e, mesmo
assim, considerar-me-ia rei do espaço infinito, não fossem os maus
sonhos que tenho!”
(Shakespeare,
Hamlet, Ato Segundo, Cena II)
Quem
é que passa, com andar de vento,
pelas
ameias do castelo,
a
perturbar o sono dos vigias?
Quem
é que cinge a espada
e
de elmo e couraça se atavia,
a
despertar a sede de batalhas?
Tudo
é silêncio e, no entanto, o inimigo
é
mais que o pensamento e seus desvãos.
Lá
longe, muito além da bruma
que
encobre a cidadela,
hordas
invisíveis se acantonam,
cheias
de estranha vilania...
...
E
o vento traz tristes cantigas,
que
se espalham pelos campos,
assustando
o pegureiro e sua grei:
–
Em Roncesvalles,
ao
pôr-do-sol,
guerreiros
aos milhares,
muitos
guerreiros de escol,
passados
ao fio da espada!
...
E ninguém vem avisar ao nosso rei?
Dentro
da escuridão da noite,
o
castelo é sua própria sombra,
sobre
si mesmo escorrendo,
como
de um grande almofariz,
mas
é possível enxergar, no silêncio,
cada
contorno seu,
pois
há brilhos fugitivos, ardendo
como
fragmentos de sol...
...
E o vento traz lúgubres cantigas,
que
atravessam os campos,
assustando
o pegureiro e sua grei:
–
Em Roncesvalles,
ao
pôr-do-sol,
guerreiros
aos milhares,
muitos
guerreiros de escol,
(Rolando
exangue)
passados
ao fio da espada,
o
riacho virou sangue!
...
E ninguém vem avisar ao nosso rei?
Solitários
como um osso,
os
monstros dormem no fosso,
mas,
de suas fauces, escorrem
estas
águas negras, enormes,
que,
ao redor do castelo, correm,
como
em torno a um velho cais...
...
E
o vento já não traz canções antigas...
Livre
da sombra da visão,
o
castelo é, agora,
só
uma memória pobre
da
névoa que a idéia encobre.
Soa,
enfim, a corneta!
Chamem
os arqueiros!
Baixem
a ponte levadiça!
Os
mensageiros vêm vindo,
em
palafréns de sonho...
Acordem
o rei,
(cúmplice
dos seus desvarios)
acordem
o rei,
mas,
sobretudo,
acordem
os monstros do fosso!
(*)
Renato
Suttana. Visita do Fantasma na
Noite. Guarapuava:
Edição do Autor, 2002.
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