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Alberto Lacet

 

Três poemas de Margarita Abella Caprile

 

 

AURORA

 

Taquicardia da insônia,

crua lucidez da aurora,

balanço vertiginoso

dos já incontáveis ontens

que engoliram a manhã:

sobressalto de entender

que esta existência de agora

é já “o depois” que tão longe

mirávamos: angustiosa

explicação com a criança

que ainda somos e não crê

senão num viver de séculos.

 

Ansiedade da abundância

que, conosco tendo vindo,

retornará ao infinito,

pois não alcança o futuro

para o que pôde fazer-se,

para o que nunca se disse.

Inquieture de entender

que naquela encruzilhada

pôde ser outro o caminho.

Pânico de não saber

se assim nos quer o mistério;

terror de não perceber

a mensagem insistente

que acaso transmite. Medo

do espanto de haver a morte

e de estar só e sem nome

perdida num panorama

de raças e de milênios.

Consciência atroz de si mesmo;

pensar que, talvez, devessem

todas as coisas ter sido

de outra maneira.

 

 

 

TARDE NO PORTO

 

Céu de suave matiz, que um sol cinza engalana,

argenteando e esbatendo a imensidão do rio.

O porto, onde ancorou a névoa baça e o frio,

tem uma placidez aflita e cotidiana.

 

A água, cinza também, que à água azul se irmana,

se resigna à quietude e acalma o seu fastio

agora em que, salobre, a quilha de um navio

da fundura distante os prodígios lhe explana.

 

De pátrias um resumo entre os diques, em frota,

mistura a palidez da neve mais remota

à lembrança de um ocre esplendor tropical.

 

Pela tarde agourenta, um vapor se retira,

parecendo, ao fugir, que sem rumo partira

a um destino qualquer misterioso e fatal.

 

 

 

SOLIDÃO

 

Ah, que desolação e que cansaço

este inútil lutar,

cada espírito é como uma ilha

à qual ninguém jamais aportará.

 

Rodeado pelo mar do egoísmo,

ou rodeado quem sabe

pelo mar de safira do seu sonho,

sozinho cada espírito há de estar.

 

Através da fundura de si mesmos

nem as ideias chegarão jamais,

se desvirtua nosso pensamento

ao cruzar.

 

A invenção incompleta das palavras

só distancia mais;

que angústia repetir por toda a vida

a explicação que nada explicará!

 

E sentir os horrores do impossível

frente a essa fatal

e infinita muralha das almas

que nem o amor consegue derrubar.

 

E volver outra vez sobre o já andado

depois de tanto andar,

e novamente a trágica e profunda

solidão!

 

 

(Traduções de Renato Suttana)

 

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